“Comecei a escrever poesia como todo mundo, na adolescência. Escrevia nas entrelinhas dos livros da escola. Era mais comum fazê-lo no livro de geografia. Havia muito espaço vazio entre as linhas e minha distração. Só fui publicar o primeiro livro com mais de trinta anos: Pequeno inventário das ausências (Prêmio Fundação Casa de Jorge Amado, 2001). Depois, a prosa se tornou minha expressão mais corriqueira. Publiquei cinco livros. A poesia voltou em Arquivos de um corpo em viagem (Editora Mondrongo, 2015) e Manual para composição de Vitrais (Selo João Ubaldo Ribeiro da Fundação Gregório de Mattos, 2019). Inventário, arquivos, manual, as palavras da burocracia estão a serviço do imponderável.”
1) Qual o objeto e por que você escolheu o objeto?
Escolhi falar do ponto de vista de um cofre antigo que herdei de minha avó. Foi uma escolha por impulso. Ao ver o exercício, olhei em volta e aquele era, à vista, o objeto mais significativo. É um móvel muito pesado, sempre foi referência na casa de minha avó. Um lugar de segredos e tão à vista. Era comum a frase: está em cima do cofre. Na minha casa, ele fica aberto. Tenho medo de a casa ser invadida e esquecer a senha para abrir. Deixo aberto para que vejam que ele não tem nada de valioso dentro. O valor é a lembrança de minha avó.
2) O que o motiva a fazer poesia hoje? Ou quem o motiva?
A poesia é uma expressão pura do que sentimos e pensamos. É o melhor lugar para tratar do imponderável da vida, aquilo que não se sustenta em uma reflexão lógica. Escrevo muito pouco poesia em comparação à prosa. São apenas três livros de poesia em vinte anos para sete de prosa. É que são tempos diferentes de criação. A poesia exige mais tempo e sorte.
3) Qual o futuro que você imagina para a poesia?
Hoje há uma produção muito grande de poesia. Poetas urgem a todo momento. Estou falando de quantidade. Mas essa produção volumosa, naturalmente, leva à qualidade. Questão de probabilidades e de maturação. Tantos ensaios e tentativas levam a um resultado melhor. A poesia, em um aspecto, é mais fácil que a prosa: exige menos esforço físico. O esforço artístico é igual ou maior, mas a energia corporal é menor. Um bom poema pode ser feito em uma semana, mas, com certeza, terão sido poucos os momentos de escrita. Um conto que se fez em uma semana exigiu muito tempo digitando até se perceber que não era bom. Parece bobo, mas é um ponto relevante sobre a profusão de poemas hoje. Nesse e em outros muitos aspectos, é uma forma de expressão acessível. Hoje, como sempre, a poesia é a primeira expressão artística dos jovens. Permanecerá assim, acredito.
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